24/01/19

Virar o bico ao prego

Nenhuma equipa gosta de perder, nenhuma equipa gosta de ser eliminada de uma competição, nenhuma equipa gosta de cair aos pés de um rival. Quando isso acontece – e, infeliz e inevitavelmente, isso também acontece por vezes com o FC Porto – há duas formas de lidar com o insucesso: olhar para dentro, identificar os problemas e procurar caminhos para resolvê-los; ou tentar virar o bico ao prego, disparar para fora e imputar aos outros as culpas próprias. Depois da derrota de terça-feira, o Benfica optou pelo segundo caminho. Por nós, tudo bem. Se o objetivo é discutir a arbitragem das meias-finais da Taça da Liga, também temos os nossos contributos:

1. Em primeiro lugar, somos obrigados a sublinhar que foi desferido um violento ataque à arbitragem por parte de quem, há não muito tempo, propôs que as críticas aos árbitros resultassem em perda de pontos no campeonato. Santa hipocrisia!

2. Temos ainda de recordar que o Benfica não deveria ter tido a oportunidade de fazer estas críticas, simplesmente porque não deveria sequer ter participado na final four da Taça da Liga. Isso só aconteceu porque o Benfica beneficiou de erros graves dos árbitros, com impacto direto nos resultados, nos três jogos que disputou na fase de grupos da competição.

3. Continuando o exercício de memória, recuamos até 9 de novembro de 2017, dia em que Luís Filipe Vieira deu uma entrevista à BTV e partilhou um desgosto: Fábio Veríssimo não apita o Benfica porquê? Na altura, Vieira clamava por Fábio Veríssimo. Anteontem, em Braga, procurou decretar o fim da carreira do árbitro de Leiria: Esse homem não pode apitar mais! Nestes momentos, quando perde a cabeça, Vieira revela-se e expressa em público aquilo que habitualmente mantém mais reservado: trata-se de alguém que julga ter o direito de escolher os árbitros que dirigem jogos do Benfica e os que devem ser ostracizados. O objetivo é sempre o mesmo: condicionar, condicionar, condicionar.

4. A propósito de eventuais erros no jogo de terça-feira, recordamos dois lances que o Benfica, a comunicação social afeta ao Benfica e os cartilheiros têm feito de conta que não existiram: aos 8 minutos, com 0-0, ficou por assinalar um penálti por falta de Rúben Dias sobre Corona; aos 82, foi poupado o segundo amarelo a Seferovic, após falta sobre Marega.

5. Curiosamente, o lance que motivou mais críticas foi um fora de jogo que, de acordo com a única imagem com linha disponibilizada pela SportTV, foi bem assinalado pelo árbitro assistente (e não pelo VAR, como os porta-vozes do Benfica têm dito erradamente). É fora de jogo por um pé, sim. Tal como houve fora de jogo por um pé, como bem recordou o nosso treinador, num golo do Portimonense contra o Benfica que foi anulado pelo videoárbitro Fábio Veríssimo na temporada passada.

6. Através do News Benfica, os porta-vozes anónimos de Luís Filipe Vieira acusam os árbitros de terem prejudicado o Benfica de forma premeditada. É uma afirmação grave e que não poderá passar sem castigo.

7. Finalmente, é curioso que o presidente de um clube afirme ter conhecimento de ameaças a árbitros e respetivas famílias, mas não as denuncie publicamente ou às instâncias próprias, como é obrigação de quem possua uma informação dessas. Luís Filipe Vieira, em particular, deveria ser especialmente sensível a esse tipo de situações, tendo em conta o histórico dos adeptos do clube que dirige no que toca a ameaças e agressões a árbitros – mas ameaças e agressões a sério, denunciadas, investigadas e julgadas pelos tribunais.

Anteontem, o FC Porto venceu porque foi melhor do que o Benfica. Foi melhor na Taça da Liga, da mesma maneira que está a ser melhor no campeonato, da mesma maneira que foi muitíssimo melhor na Liga dos Campeões. Não nos surpreende que isso seja colocado em causa por quem está a ser investigado por possível corrupção de equipas de arbitragem, de jogadores adversários, de clubes adversários, de observadores, de delegados da Liga, de funcionários judiciais e até de magistrados (e ainda por tráfico de influência, branqueamento de capitais e fraude fiscal). Não surpreende, mas há limites para a hipocrisia, o desespero e a falta de decência.

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